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Fraudes e Investigações Corporativas

A fraude é definida como “qualquer ato ardiloso, enganoso, de má-fé, com o intuito de lesar ou ludibriar outrem, ou de não cumprir determinado dever” (GREGORINI, 2009).

 

A motivação para prática de fraude tem sido estudada há décadas. Destaca-se o estudo “Other people’s money; a study of the social psychology of embezzlement”, no qual o Dr Donald Cressey entrevistou 133 pessoas que foram condenadas pela prática de fraudes corporativas. A conclusão do estudo deu origem à Teoria do Triângulo da Fraude em que são identificadas três dimensões para ocorrência de fraude: racionalização, pressão e oportunidade.

 

Segundo a Teoria do Triângulo da Fraude, a racionalização é a internalização ou conscientização de que o ato praticado é fraudulento, mas é necessário para os negócios e até aceitável naquele contexto. Um exemplo é o departamento de propinas na Lava Jato onde não se fazia negócio sem o pagamento de propinas a agentes públicos, caracterizando a corrupção.

 

A pressão é a existência de fatores externos e problemas financeiros que não podem ser compartilhados pelos agentes da fraude, logo, somente a fraude pode resolver a pressão. No mundo corporativo a pressão pode vir em formas de kickback em negociações comerciais, nas quais vendedor e comprador acertam uma transação com desconto para bater metas extremas e uma parte do valor é devolvido por fora para aquele que deu o desconto trazendo prejuízo à empresa.

 

A oportunidade é a chance de cometer a fraude sem ninguém perceber. Um exemplo no mundo corporativo é a fraude em folhas de pagamento com empregados fantasmas e pagamentos fraudulentos a terceiros e familiares.

 

O relatório anual da ACFE destrinchou estatisticamente a ocorrência de fraude e verificou que o tipo de fraude de apropriação indevida (ou furto) de bens ocorre isoladamente em 47% das vezes, enquanto a corrupção ocorre somente me 12% das vezes e a fraude financeira isoladamente acontece 1% das vezes. Por outro lado, o relatório também demonstra que apesar de menos comum e frequente, a fraude financeira é o tipo de fraude que traz maior perda financeira, atingindo uma média de US$593 mil, enquanto as perdas médias de corrupção e apropriação indevida (ou furto) de bens atingem médias de, respectivamente, US$150 mil e US$100 mil.

 

Todas as empresas estão expostas aos riscos de fraude e a adoção de estruturas adequadas para prevenção, detecção e resposta às práticas fraudulentas são essenciais para mitigação ou eliminação desse risco. O programa de compliance apresenta mecanismos importantes para governança e gestão de riscos. Nesse sentido, os principais mecanismos dos programas de compliance para lidar com fraudes são:

 

  • Políticas e procedimentos de compliance
  • Cultura de integridade, engajamento e conscientização
  • Treinamentos
  • Comunicação
  • Controles internos
  • Auditorias internas
  • Remuneração justa
  • Canal de Denúncias
  • Investigações Corporativas e Criminais
  •  

    Em operações societárias e bancárias, as fraudes podem configurar corrupção. Segundo a Lei n.º 12.846/2013 (“Lei Anticorrupção”), o prazo de prescrição para responsabilização de empresas por atos lesivos à administração pública, incluindo atos de corrupção, começa a fluir a partir da data da ciência da infração ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

     

    Caso ocorra o ato lesivo à administração pública previsto na Lei Anticorrupção, a empresa sofrerá sanções que incluem multa de 0,1% a 20% do faturamento bruto da empresa. A multa pode ser atenuada por alguns fatores, inclusive a existência de efetivo canal de denúncia e procedimento de investigação interna, conforme artigo 57 do Decreto n.º 11.129/2022.

     

    De forma a prevenir a, detectar o quanto antes a ocorrência de ou responder com ações internas que interrompam a prática fraudulenta, o canal de denúncia é a principal forma para que as empresas tomem conhecimento sobre o que está ocorrendo em sua empresa. Igualmente, após o recebimento do relato, é necessário um procedimento de investigação definido para as fases corporativa e criminal. O fluxo investigatório deve estabelecer os critérios objetivos para garantir efetividade da investigação e proteção e garantia de sigilo ao denunciante. Por exemplo, possibilidade de envio de relatos de forma anônima, segurança de não-retaliação, quais são as classificações utilizadas, quais são os casos críticos (e.g., corrupção), quais são os casos que precisa de contratação externa especializada (e.g., fraude financeira que demanda a contratação de perícia forensic) e código de ética do próprio investigador para não contaminar a investigação de modo a impossibilitar que a empresa busque responsabilização dos indivíduos que praticaram a fraude de forma judicial e criminal.

     

    Pesquisas recentes demonstram que fraudes são cada vez mais comuns e atingem um público específico. Segundo recente pesquisa realizada pela McKinsey (TECCHIO, 2024), as empresas baseadas na América Latina perdem até US$130 bilhões por falta de governança para conter as fraudes corporativas. Enquanto isso, a CVM (2020) verificou em estudo que o perfil mais comum das vítimas de golpes financeiros era “composto majoritariamente de homens (91%), com idade entre 30 e 39 anos (36,5%) com renda familiar mensal entre 2 e 5 salários-mínimos (23%) e com pós-graduação (38%)“. Ainda segundo a CVM (2020), o canal de denúncias foi importante para que fossem tratadas as fraudes, pois as vítimas de fraude, “quando perguntados se, após perceberam que realmente se tratava de uma fraude, havia sido feita alguma reclamação ou denúncia, 46,6% dos entrevistados disse que sim. A partir desta base, de 83 indivíduos, a CVM figurou como opção de órgão de denúncia para 65,1% das vítimas, seguida pela própria empresa fraudulenta (49,4%), advogado particular (45,8%), sites de reclamação (31,3%), entre outros“.

     

    Analisando casos concretos e as recentes pesquisas mencionadas acima, é possível perceber que treinamentos e comunicações ensinando e encorajando o uso do canal de denúncias aproximada os colaboradores internos e externos da empresa funcionam como ferramentas valiosas para o compliance officer para rapidamente lidar com casos de fraude com todos os tipos de complexidade e evitar impactos financeiros, reputacionais e operacionais às empresas.

     

    A equipe de Ética, Compliance e Investigações do Pinheiro Guimarães está à disposição para prestar assessoria jurídica relacionadas a essa matéria.

     

    Referências:
    GREGORINI, Adilmar. (2009) “Auditoria de detecção de fraude” in Revista da CGU / Presidência da República, Controladoria-Geral da União. – Ano IV, n.º 6, Setembro/2009. Brasília: CGU, 2009.
    TECCHIO, Manuela. (2024) Valor Econômico. “Nas contas da McKinsey, empresas perdem até US$130 bi por ano com fraudes na América Latina“.
    CVM (2020). ” Relatório da pesquisa com vítimas de fraudes financeiras“.

     

    Este artigo foi elaborado por André Cunha S. A. Andrade, advogado na área de Ética, Compliance e Investigações.


       

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